História metamorfoseada. É o que se constata quando se relaciona acontecimentos históricos de racismo em Olimpíadas de outrora com os Jogos de Londres 2012. Há também certos imobilismos sociais dos negros em determinados esportes, como o futebol e o atletismo, e suas quase ausências na ginástica, natação e tênis. Essas questões atrelam-se a duas dimensões do racismo, a primeira tendo-o como instrumento de inferiorização e estereotipação do negro, e a segunda, como mecanismo de exclusão.
Em 1856 o francês Gobineau classificou as raças humanas. Para ele, os negros teriam intelecto débil, propensões animais fortes e a moral parcialmente latente; os amarelos teriam intelecto medíocre, propensão animal moderada e a moral comparativamente desenvolvida; já os brancos teriam intelecto vigoroso, propensões animais fortes e a moral altamente cultivada. Esse racialismo legitimou a biologização do outro, que seria estigmatizado e excluído socialmente, utilizando uma falsa ciência pra tal, corroborando com objetivos políticos e ideológicos da época.
Em 1936 quando o afro-americano Jesse Owens venceu 4 provas do Atletismo nos Jogos de Berlim na presença de Hitler, houve uma desestabilização de ideias eugenistas e nazistas que legitimavam a inferiorização do negro e do judeu, de maneira a despotencializar engodos deterministas. Nos últimos anos houve muitos notíciários indicativos de racismos no futebol europeu direcionados principalmente a africanos e a latino-americanos resignificando práticas antigas que se travestem em novos e potentes intrumentos de poder que estabelece quem é superior ou inferior, incluído ou excluído.
Nos Jogos de Londres, infelizmente deparamos, nas redes sociais, com dois casos desses motes. O primeiro foi o da saltadora grega Paraskevi Papahristou que direcionou ofensas aos africanos; e o segundo foi o do jogador suíço Michel Morganella que depreciou os sul-coreanos designando-os de “bando de retardados”. A parte feliz desses casos foi à exitosa expulsão dos atletas pelos próprios Comitês Olímpicos dos países dos esportistas, com um rechaçamento das atitudes praticadas que infligiam lemas olímpicos, o respeito aos direitos humanos e a diversidade das nações. Desde o século XIX que o determinismo biológico sofre críticas. Hoje é sabido que do ponto de vista científico, não há raças, mas sim, raça humana. No entanto, a ideia de raça ainda se incrusta nos imaginários e práticas humanas, como nos casos evidenciados.
O livro “The Bell Curve” de 1994 reafirma que os negros têm Q.I inferior ao dos brancos, já outros indicam que os negros seriam mais propensos taxativamente ao atletismo, e menos para a natação. Mas, exemplos nos mostram que, para além de explicações biológicas fatalistas, quando os negros têm oportunidades e investimentos em esportes historicamente elitistas, como natação, ginástica e tênis, eles explicitam o oposto dessas ideologias. Daiane dos Santos da ginástica, Anthony Nesty da natação e Arthur Ashe do tênis, comprovaram a ineficácia de pesquisas que engessam a realidade, fortificam nacos de privilégios nos esportes de uma elite que ampliam ainda mais a desigualdade.
Então, que o processo de resistência social que sempre rebateu pensamentos e práticas racistas continuem a combater uma educação envenenada que atinge o esporte. Que atentamos no pensamento e na ação, sejam em quadras, pistas e piscinas, para que a igualdade acompanhe o princípio da diferença.
Artigo publicado inicialmente no jornal capixaba A Tribuna na página 24 da Seção “Tribuna Livre”, em 08/08/2012.
Professor do Ensino Superior. Doutorando em Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFES. Membro do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UFES.